A propósito da ilusão da felicidade e do fim do sofrimento
Procurar a Deus para sair do sofrimento é um desentendimento. O desentendimento é o seguinte: supor que o sofrimento é acidental, que, por isso, pode estar ou pode acabar, que agora nos oprime mas que, com a ajuda de Deus, seremos libertados dele pouco a pouco ou talvez abruptamente, por um qualquer milagre, seremos lançados na felicidade.
Mas o sujeito que assim pretende tornar-se feliz torna-se feliz como? Será que se torna feliz pela relação que tem com Deus? Mas, então, permanece no sofrimento. Ou será que quer dizer que quando recebe uma rica herança, quando a doença passar, quando o filho se curar ou as dores forem apaziguadas - numa palavra - será que quando o seu sofrimento for eliminado o sujeito se torna feliz porque o sofrimento foi aliviado? Porque se o sujeito se torna feliz porque o sofrimento foi aliviado então não foi na relação com Deus que o sujeito se tornou feliz e toda a sua gratitude é uma expressão estética. Religiosamente - quando o religioso é plenamente compreendido - tudo o que é exterior é, qualitativamente, o acaso, a sorte ou o azar, o que ética-religiosamente é nada. Religiosamente, sabe só Deus se uma doença é um castigo ou uma benesse, se a riqueza é um castigo ou uma benesse, se a saúde é um castigo ou uma benesse - poderia mesmo acontecer que um sujeito ofendesse a Deus e Deus o castigasse - para que a sua perdição fosse maior - justamente com aquilo que, do ponto de vista do mundo, é grande e apreciado: riquezas, carros, mulheres, uma carreira e muitos filhos. E então seria verdadeiramente essa a sua perdição se ele, mergulhado na sua felicidade, julgasse por intermédio dela beneficiar da graça divina quando era a sua perdição que estava a ser derramada sobre ele.
quinta-feira, 19 de dezembro de 2013
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