segunda-feira, 30 de setembro de 2013

Autárquicas de 2013 - crítica

A propósito de eleições, vencedores e derrotados

Autárquicas 2013

Vencedores e Derrotados

Tratando-se de eleições autárquicas, não penso que se devam inferir lições nacionais de casos particulares.
Dito isto, a nível nacional pode ser possível verificar tendências, generalidades que, de algum modo, podem permitir certas conclusões a nível nacional.
O PSD é a grande força autárquica em Portugal. Mas, a nível nacional, teve (até ao momento) 103 Presidentes de Câmara (PSD + coligações lideradas pelo PSD) contra 140 Presidentes de Câmara do PS (PS + coligações lideradas pelo PS).

Ora, se o PSD teve 103 câmaras contra 140 do PS é justo que se diga que o PSD é o grande derrotado.

A análise da situação do PS é mais complicada. Tem mais câmaras do que qualquer outra força política. Se considerarmos as situações em que PS e PSD concorreram sem coligações, o PS teve 36,4 % contra 16,61% do PSD, o que é um resultado bastante expressivo. Contudo, se considerarmos todas as situações em que PS e PSD lideraram a candidatura, então o PSD teve 37,55% contra 36,82% do PS. Portanto, se quisermos ser imparciais não podemos dizer sem mais que o PS teve mais votos, embora tenha sido o partido que, a concorrer sozinho, teve mais votos. Em 2009, a concorrer sozinho, o PS teve uma percentagem maior de votos (37,8%, mais de 2 milhões de votos) do que este ano (36,34%, 1,7 milhões de votos).

Ainda assim, o único vencedor é, suponho, o PS, porque teve mais candidaturas a vencer (e não porque teve mais votos, pois isso é outra discussão). As restantes forças políticas (e estou a falar a nível nacional) perderam. Quem em 300 tiver 1 câmara e passar a ter 5, enquanto outros têm 140 ou 100, não se dirá que ganhou, mas que, sendo um perdedor, melhorou.

A CDU é, dentro dos perdedores, um dos que melhorou a sua participação. É, por isso, em certo sentido, um vencedor. Teve mais votos, mais câmaras, mais vereadores do que em 2009, melhorou em toda a linha e não teve perdas a assinalar.

O CDS teve menos votos mas mais câmaras. Isto significa que melhorou, em termos de candidaturas que venceram, porque agora ganharam 5 candidaturas suas e, em 2009, ganhou só uma. Mas não deve ser esquecido que teve menos votos em absoluto e menos percentagem dos mesmos. Não ganhou estas eleições. Não é um vencedor. é vencedor apenas "em certo sentido", um sentido bem determinado: ganhou 5 câmaras em mais de 300, mas como antes só tinha uma, melhorou.

O BE é, a par do PSD, o outro partido que, de entre os perdedores, perdeu mesmo. Não há volta a dar-lhe, e com certeza que os simpatizantes do Bloco esperam (eu espero) que a liderança não se ponha a aventar desculpas, a tecer interpretações, leituras profundas e inteligentes que demonstrem que, afinal, o BE não perdeu ou até talvez tenha ganho. Porque se o BE se puser a fazer esse tipo de bailados acabará por demonstrar aos seus simpatizantes que não é diferente dos partidos alinhados. A coisa é relativamente simples: se o BE exigir, e parece que exige, ao PSD que tome lições nacionais destas eleições autárquicas, então o BE tem de reflectir internamente e tirar conclusões destas eleições autárquicas. Se o PSD deve tirar conclusões, o BE também. Se o BE assobiar para o lado e nada fizer quanto a si mesmo, perde toda a legitimidade moral para exigir ao Governo que o faça. É altura do BE mostrar que é diferente do PSD, diferente do Governo.

Passos Coelho. O Primeiro Ministro é o perdedor mais evidente. Em termos pessoal é ele o grande derrotado. Sobretudo, porque ele se envolveu. E perdeu.
O Seguro não é um vencedor claro, em termos pessoais. Não há dados objectivos que permitam confirmar uma vitória pessoal a nível nacional, nestas eleições. Nem António Costa. Mas António Costa ganhou Lisboa e isso vale muito - vale na medida em que António Costa queira. Os Lisboetas não ficariam irritados se ele saísse para Governar o país. Estas eleições autárquicas apenas confirmaram o Seguro como líder do PS na medida em que António Costa permita. Uma decisão de Costa e Seguro já era.

Alberto João Jardim. Jardim começou a perder a Madeira quando começou a perder a liberdade de gastar como quisesse e a habilidade de enviar ao Continente a conta. Mas antes de perder a Madeira perdeu o PSD-Madeira. Ganhou as eleições internas por uma unha negra. Nas eleições autárquicas de ontem ficou com 4 câmaras em 11. Foi outro derrotado - não a nível nacional, como é evidente, mas a nível regional. Vejamos até que ponto controla o seu Partido regional, os seus deputados na região e os seus deputados na Assembleia da República. Vejamos que artimanhas ele encontrará em cada uma destas plataformas para não abandonar o Poder.




quinta-feira, 26 de setembro de 2013

Milagres... Os milagres de Vespasiano

A propósito de milagres...

Tácito deixou este relato de duas curas operadas por Vespasiano, o César, Imperador de Roma.

"Nos meses em que Vespasiano, em Alexandria, esperava os dias dos ventos de Verão e mar estável, muitas maravilhas (miracula) aconteceram, as quais mostraram o favor do céu e a inclinação das divindades por Vespasiano. Um dos plebeus de Alexandria, conhecido pelo declínio dos olhos, prostrou-se de joelhos e implorou, soluçando, por um remédio para a cegueira, a conselho do deus Serapis, a quem o povo cultivava entregando-se-lhe com superstição mais do que a qualquer outro; suplicou ao príncipe que se dignasse borrifar as suas bochechas e órbitas dos olhos com cuspo. Outro, com uma mão doente, por conselho do mesmo deus, pediu que o César lha calcasse com a planta do pé. Primeiro, Vespasiano riu, recusou; e eles insistiam de modo que ele temeu uma fama vã, mas por outro lado a teimosia deles e as vozes dos aduladores induziram-no em esperança. Por fim, solicitou que os médicos estimassem se tal cegueira e debilidade estavam acima de ajuda humana. Os médicos discutiram diversos pontos: num deles a força da luz não fora consumida e poderia voltar se se atacasse o obstáculo; no outro, as articulações deslocadas, se aplicada força curativa, poderiam restaurar-se; talvez os deuses o quisessem e o divino ministério tivesse escolhido o príncipe; por fim, o sucesso do remédio seria a glória do César, enquanto o ridículo em caso de insucesso caíria sobre os desafortunados. Assim, Vespasiano, acreditando que tudo era possível à sua sorte e que nada mais seria inacreditável, com o seu semblante alegre, entre a multidão em expectativa, acedeu aos pedidos. Imediatamente, a mão voltou ao uso, e o dia brilhou para o cego. Os que estiveram envolvidos nisto ainda hoje o relembram quando nada ganhariam com a mentira."


Per eos mensis quibus Vespasianus Alexandriae statos aestivis flatibus dies et certa maris opperiebatur, multa miracula evenere, quis caelestis favor et quaedam in Vespasianum inclinatio numinum ostenderetur. e plebe Alexandrina quidam oculorum tabe notus genua eius advolvitur, remedium caecitatis exposcens gemitu, monitu Serapidis dei, quem dedita superstitionibus gens ante alios colit; precabaturque principem ut genas et oculorum orbis dignaretur respergere oris excremento. alius manum aeger eodem deo auctore ut pede ac vestigio Caesaris calcaretur orabat. Vespasianus primo inridere, aspernari; atque illis instantibus modo famam vanitatis metuere, modo obsecratione ipsorum et vocibus adulantium in spem induci: postremo aestimari a medicis iubet an talis caecitas ac debilitas ope humana superabiles forent. medici varie disserere: huic non exesam vim luminis et redituram si pellerentur obstantia; illi elapsos in pravum artus, si salubris vis adhibeatur, posse integrari. id fortasse cordi deis et divino ministerio principem electum; denique patrati remedii gloriam penes Caesarem, inriti ludibrium penes miseros fore. igitur Vespasianus cuncta fortunae suae patere ratus nec quicquam ultra incredibile, laeto ipse vultu, erecta quae adstabat multitudine, iussa exequitur. statim conversa ad usum manus, ac caeco reluxit dies. utrumque qui interfuere nunc quoque memorant, postquam nullum mendacio pretium.

Tácito, Historiae, IV, 81 




sábado, 21 de setembro de 2013

Origem dos nomes / etimologia - Letra C

C


Cristiano: do grego χριστιανός [khristianós], "de cristo", "cristão" - através do latim christianus.
O nome Cristiana é a forma feminina de Cristiano.

Cristina: de Cristiana, forma feminina de Cristiano.








Tecnoética

A propósito de tecnoética...

A tecnoética é um ramo da ética - ainda não devidamente circunscrito - que se debruça sobre os problemas éticos decorrentes da tecnologia e da investigação tecnológica, quer na aplicação de tecnologias já existentes, quer no desenvolvimento de tecnologias cujo potencial pode, previsivelmente, ter implicações éticas. Assim, teoricamente, este ramo pode ser dividido em quatro tipos de problemas.

1 - problemas éticos decorrentes da aplicação de tecnologias já existentes, cujo funcionamento está descrito e sobre as quais se conhece o suficiente para poder prever os seus efeitos. Por exemplo, a utilização de embriões humanos e de tecnologia de clonagem para produzir órgãos que possam servir em transplantes - embora a utilização dessas tecnologias já existentes seja discutível quanto ao seu teor ético e moral, não resulta dessa utilização uma nova tecnologia, também ela, sujeita a dúvidas, pelo menos tendo por base o que legitimamente se pode esperar.

2 - problemas éticos decorrentes da aplicação de tecnologias já existentes em utilizações potencialmente perversas, ou, pelo menos, de moralidade duvidosa, na investigação e no desenvolvimento de novas tecnologias, sendo que estas novas tecnologias já apresentam, por si mesmas, um potencial perverso. Por exemplo, a utilização de tecnologias de monotorização, vigilância e controlo dos cidadãos para desenvolver tecnologias que permitam prever, antecipar ou atribuir comportamentos futuros a sujeitos com base nos seus comportamentos monotorizados (isto é, tecnologias do tipo Relatório Minoritário). Não só o uso das tecnologias disponíveis é duvidoso, como também as tecnologias que se espera poderem resultar desse uso são, elas mesmas, duvidosas - sendo, por exemplo, discutível se não seria melhor não as desenvolver de todo.

3 - problemas éticos decorrentes da investigação tecnológica como tal. Por exemplo, problemas como o de saber se continua a ser legítimo investir em investigação quantidades de dinheiro que poderiam ser úteis na aplicação de tecnologias de saúde ou na erradicação da fome ou do analfabetismo. Ou se é legítimo investir dinheiro em tecnologias que se pode esperar não terem efeitos sobre a existência quotidiana, como a tecnologia de prospecção espacial (a discussão em si mesma é independente da discussão prévia, de carácter mais científico do que filosófico, de saber se essa investigação se pode dizer, de facto, não vir a ter efeitos benéficos na vida quotidiana).

4 - problemas éticos decorrentes da investigação tecnológica na medida em que se pode esperar que dela resultem efeitos ou tecnologias cuja aplicação levantem problemas éticos ou morais. Neste caso, a utilização de tecnologias actualmente existentes não constitui, por si mesma, um problema ético nem moral, mas é a própria tecnologia futura ou uso futuro dessa tecnologia que constitui o problema. Por exemplo, os estudos relacionados com as viagens no tempo são absolutamente neutras perante a ética e a moral, pois nenhuma actuação nessa investigação é condenável enquanto tal, nem perversa por si mesma - contudo, é a própria tecnologia cujo uso permitisse viajar no tempo que tem um teor ético ou moral forte, discutível e potencialmente crítico. Este tipo de problemas pode constituir um grupo particularmente importante porque apresenta, em geral, duas características que, aliadas, se tornam muito perigosas: primeira, as acções dos cientistas no percurso da sua investigação não levantam dúvidas éticas e morais, são aparentemente inócuas (acelerar partículas, fazê-las colidir, elaborar teorias matemáticas e físicas, etc, são acções que não suscitam indignação moral nem desconfiança ética), de tal modo que os cientistas podem perfazer todos os passos até chegar ao desenvolvimento da tecnologia sem fazerem qualquer acto condenável ética, moral ou juridicamente; em segundo lugar, é a tecnologia resultante que é muito perigosa, com efeitos exponenciais (do que a viagem no tempo é um bom exemplo, pois uma pequena alteração no passado longínquo pode ter efeitos absolutamente grandes e incalculáveis). O perigo deste tipo de problemas reside, justamente, no facto de o perigo não ser evidente nem mesmo quando se pondera o uso dessa tecnologia futura (fazer viagens no tempo não se mostra imediatamente perigoso, mas sobretudo não é uma ideia que cause repugnância ou aversão, como é o caso de outros problemas éticos ou morais associados a actuações imediatamente repulsivas).


sexta-feira, 20 de setembro de 2013

Origem dos nomes / etimologia - Letra L

L


Ludovico: do franco (língua germânica) hlodwig, "guerreiro glorioso"; de hlod, "glória", com wig, "combate" - através do alemão, Ludwig e do latim, Ludovicus. Ver, também, Luís.

Luís: do franco (língua germânica) hlodwig, "guerreiro glorioso"; de hlod, "glória", com wig, "combate" - através do francês, Louis. Ver, também, Ludovico.



Origem dos nomes / etimologia - Letra A

A


Alexandre: do grego Ἀλέξανδρος [Aléksandros], "protector do homem"; do verbo ἀλέξειν [aléksein], "proteger", "ajudar, assistir", "compensar", com o substantivo ἀνήρ [anér], "homem", no genitivo ἁνδρός [andrós], "do homem". Através do latim Alexander.
O nome Sandra deriva da forma feminina Alexandra.

Ana: do grego Ἅννα [Hanna]; do hebraico חַנָּה [Khannah ou Hannah], "Graciosa", "favorecida"; do verbo חָנַן [khanan], "mostrar-se favorável", "ser gracioso, dar graças". Através do latim Anna.
O nome Ana entra na composição de muitos outros nomes (por exemplo, JoanaMariana).






O nada do viver bem nas nossas sociedades modernas

A propósito da sociedade moderna...

"é possível viver nas nossas sociedades modernas, e bem apesar de tudo, sem nunca levantar as questões fundamentais" (Luc Ferry) - mas se, então, esse "viver bem" desaparece, o nada sai do escondimento. Não é que de repente se tenha perdido tudo, mas sim que de repente se percebeu que nunca se teve nada.

Origem dos nomes / etimologia - Letra J

J

Joana: ver João.

João: do grego Ἰωάννης [Ioánnés]; do hebraico יוֹחָנָן [Yokhanan], o mesmo que יְהוֹחָנָן [Yehokhanan], "Deus mostrou-se favorável", "Deus é propício" ou "graça divina"; deriva do nome próprio de Deus, o tetragrama יְהֹוָה [YeHoWaH ou YaHWeH], "YHVH" (habitualmente dito, em português, "Jeová" ou "Yavé"), com o verbo חָנַן [khanan], "mostrar-se favorável", "ser gracioso, dar graças". Através do latim Iohannes.
A nível internacional, o nome João tem correspondentes vários, sendo etimologicamente o mesmo que: Giovanni, Johannes, Yohanes, Juan, Jean, Hans, entre outros.

Jorge: do grego Γεώργιος [Gueórgios], de γεωργός [gueorgós], "agricultor", "que trabalha a terra"; de γῆ [guê], "terra", e ἔργον [érgon], "trabalho" - através do latim, Georgius.
O mesmo que George, nome que, de facto, está mais próximo do original grego.
A origem do nome do país do cáucaso, Geórgia, é completamente independente.









quinta-feira, 19 de setembro de 2013

Ética e moral - o estatuto dos humanos e dos animais

A propósito de animais e humanos

A. Considere o caso hipotético seguinte.

1. A humanidade evoluiu de tal modo que todas as pessoas, ou, pelo menos, a grande maioria delas, reconhece aos animais o mesmo estatuto moral que aos humanos.

2. A humanidade evoluiu de tal modo que consegue viajar no tempo, para o passado.

3. A humanidade desenvolveu, também, armas de defesa planetária de grande envergadura, de tal modo que dispõe de um sistema contra objectos extra-terrestres, o qual permitirá defender o Planeta de asteróides como aqueles que provocaram as extinções em massa anteriores.

B. Responda, fundamentando, às questões seguintes.

α. Do ponto de vista ético ou moral seria legítimo viajar para o passado com o fim de evitar a ascensão de Hitler? (note que não é possível prever as consequências desse acto uma vez que seja executado)

β. Do ponto de vista ético ou moral seria legítimo viajar para o passado com o fim de evitar a extinção em massa que ocorreu há 251 milhões de anos, na qual se extinguiram 96% das espécies marinhas e 70% das espécies terrestres? (note que, tanto quanto os cientistas lhe podem dizer, ao impedir essa extinção impediria também que alguma vez viessem a existir humanos)

quarta-feira, 18 de setembro de 2013

Da educação das crianças, Plutarco - citando Licurgo

A propósito de Educação...


Então, quando os Lacedemónios se reuniram, disse-lhes [Licurgo]: "O mais decisivo em conceber a excelência, homens, Lacedemónios, são os hábitos e os tipos de educação e instruções e modos de vida, e eu vou fazer com que isso seja evidente de uma vez por todas". Então, acercando-se dos dois cachorros soltou-os tendo posto entre eles um prato e uma lebre mesmo à frente dos cachorros. E um correu para a lebre, o outro apressou-se para o prato. Mas como os Lacedemónios não foram capazes de juntar as peças e de captar o significado da exibição dos cães, ele disse-lhes: "Ambos da mesma geração, mas como aconteceu terem recebido diferentes criações, um tornou-se um glutão, mas o outro um caçador."

Plutarco, ΠΕΡΙ ΠΑΙΔΩΝ ΑΓΩΓΗΣ, 4
Εἶτά ποτε τῶν Λακεδαιμονίων εἰς ταὐτὸ συνειλεγμένων, « Μεγάλη τοι ῥοπὴ πρὸς ἀρετῆς κύησίν ἐστιν, ἄνδρες, » ἔφησε, « Λακεδαιμόνιοι, καὶ ἔθη καὶ παιδεῖαι καὶ διδασκαλίαι καὶ βίων ἀγωγαί, καὶ ἐγὼ ταῦθ´ ὑμῖν αὐτίκα δὴ μάλα ποιήσω φανερά. » Εἶτα προσαγαγὼν τοὺς δύο σκύλακας διαφῆκε, καταθεὶς εἰς μέσον λοπάδα καὶ λαγωὸν κατευθὺ τῶν σκυλάκων. Καὶ ὁ μὲν ἐπὶ τὸν λαγωὸν ᾖξεν, ὁ δ´ ἐπὶ τὴν λοπάδα ὥρμησε. Τῶν δὲ Λακεδαιμονίων οὐδέπω συμβαλεῖν ἐχόντων τί ποτ´ αὐτῷ τοῦτο δύναται καὶ τί βουλόμενος τοὺς σκύλακας ἐπεδείκνυεν, « Οὗτοι γονέων, » ἔφη, « τῶν αὐτῶν ἀμφότεροι, διαφόρου δὲ τυχόντες ἀγωγῆς ὁ μὲν λίχνος ὁ δὲ θηρευτὴς ἀποβέβηκε. »

Jesus - uma mensagem inovadora

A propósito de Jesus

Como podereis vós acreditar, [vós] que tomais fama uns dos outros e a fama do deus único não procurais? [...] Então, aqueles humanos tendo visto o que ele fez disseram: "Este é verdadeiramente o profeta que está para vir ao mundo". Jesus, então, tendo compreendido que eles pretendiam vir e forçá-lo de modo a fazê-lo rei, retirou-se novamente para o monte sozinho.

João 5:44; 6:14-15
πῶς δύνασθε ὑμεῖς πιστεῦσαι, δόξαν παρὰ ἀλλήλων λαμβάνοντες, καὶ τὴν δόξαν τὴν παρὰ τοῦ μόνου Θεοῦ οὐ ζητεῖτε; [...] Οἱ οὖν ἄνθρωποι ἰδόντες ὃ ἐποίησεν σημεῖον ἔλεγον ὅτι Οὗτός ἐστιν ἀληθῶς ὁ προφήτης ὁ ἐρχόμενος εἰς τὸν κόσμον. Ἰησοῦς οὖν γνοὺς ὅτι μέλλουσιν ἔρχεσθαι καὶ ἁρπάζειν αὐτὸν ἵνα ποιήσωσιν βασιλέα, ἀνεχώρησεν πάλιν εἰς τὸ ὄρος αὐτὸς μόνος.

Disseram aqueles homens, depois de verem o que Jesus fez, que ele era verdadeiramente o profeta esperado. Aparentemente, acreditaram nele, porque viram, e porque viram reconhecem-no. Não o reconheceram pela sua mensagem, por aquilo que ele lhes disse. Não. Foi antes o êxtase do extraordinário, o êxtase dos milagres que os cativou.

Esperávamos, talvez, um Jesus agradecido, contente com o reconhecimento da multidão. Mas nada disso se passou. Jesus recolheu-se, sozinho, no monte. Descontente. Descontente porque percebera que fora o êxtase da multidão frente ao seu líder, o êxtase da multidão em rebelar-se contra os invasores Romanos - Jesus percebera que aqueles homens não o compreenderam - se é que algum o compreendeu.

Jesus falava-lhes de alhos e eles regozijavam-se na perspectiva dos bugalhos. Mas o Reino de Jesus não seria deste mundo e aqueles homens queriam um rei para este mundo. 

Este trecho do Novo Testamento é absolutamente fundamental. A frase "Este é verdadeiramente o profeta que está para vir ao mundo" parece indicar que Jesus fora bem aceite, compreendido e louvado. Contudo, essa aparência é que constitui a ilusão aqui em causa. Não, Jesus não fora compreendido. O vinho novo continuava a ser colocado em vasilhas velhas.

Aqueles homens louvavam-no e queriam fazer dele o seu Rei - mas Jesus não estava ali para ser Rei deles, não estava ali para alimentar os seus êxtases e as suas aspirações mundanas.



terça-feira, 17 de setembro de 2013

Origem dos nomes / etimologia - Letra F

F


Filipe: do grego φίλιππος [fílippos], "amante de cavalos"; de φίλος [fílos], "amante", e ἵππος [híppos], "cavalo" - através do latim, Philippus.
Filipe II da Macedónia foi o pai de Alexandre, o Grande.

Origem dos nomes / etimologia - Letra M

M


Maria: do grego Μαρία [María], a mãe de Jesus (Mt 1:16), no Novo Testamento; do hebraico מִרְיָם [Miryam], irmã de Aarão (Ex 15:20). 
O nome Μαρία surge no Novo Testamento, também na forma Μαρίαμ [Maríam], que é simplesmente a transliteração do aramaico, para designar várias mulheres, não só a mãe de Jesus. A forma Μαρίαμ já aparecia na Septuaginta (Ex 15:20) para verter o hebraico מִרְיָם [que se pronuncia meer-yawm']. O significado do nome Miryam é discutível, no entanto é provável que provenha de מֶ֫רִי [meri], "rebelião", "rebelde".
O nome Miryam pode também ter origem egípcia, em mry, "amada", ou assíria, em yam, "mar". Outras teorias sugerem que Miryam possa significar "desejosa por uma criança".
Resumindo, Maria deriva do hebraico, Miryam, por via do grego, María. Não se sabe ao certo o que significa, mas várias teorias apontam para os significados seguintes: "rebelde", "amada", "do mar", "mar da amargura", "desejosa por uma criança".
Finalmente, convém esclarecer que o nome Maria existia no latim como feminino de Marius, mas sem qualquer ligação ao nome "Maria" bíblico - o nome Marius, ou o seu derivado Mário, não tem a mesma origem que o nome Maria, visto que Marius é um gentílico de origem propriamente romana (gens Maria), ao contrário do nome Maria que provém do hebraico.


Mário: do latim Marius, um nome romano relativo a uma família plebeia romana, gens Maria (o gentílico Maria não tem, neste caso, qualquer relação etimológica com o nome Maria).
A origem do nome Marius está sujeita a dúvidas. Parece derivar de mas, mari, "masculino, másculo", mas pode também derivar de Mars, o deus romano da guerra, "Marte".
Nos tempos da Cristandade, o nome Mário, Marius e Maria, podem ter sido usados como sendo as formas masculina e feminina um do outro, mas na verdade têm etimologias completamente diferentes.






















segunda-feira, 16 de setembro de 2013

Origem dos nomes / etimologia - Letra G

G


Gaudêncio: do latim Gaudentius, "aquele que se alegra". Do verbo latino gaudere, "alegrar-se". Ainda hoje usamos o termo "gáudio", do latim, gaudium, que significa "alegria".
O nome existe desde, pelo menos, o século IV d. C. Cf. São Gaudêncio, Bispo de Bréscia de 387 a 410, ano da sua morte;  Flavius Gaudentius, que morreu em 425, pai do general romano Flavius Aetius (396-454), dux et patricius.


George: do grego Γεώργιος [Gueórguios], de γεωργός [gueorgós], "agricultor", "que trabalha a terra"; de γῆ [guê], "terra", e ἔργον [érgon], "trabalho" - através do latim, Georgius. O mesmo que Jorge.

domingo, 15 de setembro de 2013

A Coreia do Sul e o "smile lipt"

A propósito de sorrisos...

Na Coreia do Sul parece que as pessoas descobriram as enormes vantagens das operações plásticas. Quando a Coreia do Norte obrigou os seus concidadãos a usar os mesmos penteados, soube-se que na Coreia do Sul as pessoas voluntariamente se sujeitavam a operações para serem todas parecidas.

Agora, a Coreia do Sul, do alto do seu rápido progresso em ordem ao desenvolvimento científico e tecnológico, voltam a surpreender-me:

- uma nova moda ameaça tornar-se viral: chama-se smile lipt, e trata-se de uma cirurgia estética concebida para pôr as pessoas a sorrir permanentemente...

Parecem-me extremamente excessivos os contornos que a obcecação com o sucesso e com a "felicidade" tem no nosso mundo...  

sexta-feira, 13 de setembro de 2013

Ele está de volta, de Timur Vermes

A propósito de,

  30 de agosto de 2011. Um velho acorda num terreno baldio de Berlim. Deitado no chão, só vê o céu azul por cima da cabeça e fica surpreendido ao ouvir o canto dos pássaros, sinal de que estamos a testemunhar pelo menos uma pausa nos combates.

  O homem tem uma grande dor de cabeça e não sabe onde se encontra nem como ali chegou. Tenta lembrar-se do que fez na véspera: a amnésia não pode ser explicada pelo álcool – porque o Führer não bebe! Em vão, procura em redor o seu fiel Bormann. Hitler levanta-se com dificuldade e dirige-se para as vozes de três rapazes da Juventude Hitleriana, certamente de licença porque não estão fardados e jogam à bola. "Ei, velhote, olha p’ra isto! Quem é este velho?" "Devo estar mesmo com mau aspeto", pensa o Führer, ao registar a falta da saudação regulamentar. "Onde está o Bormann?", preocupa-se novamente. "Quem é esse?" "Bormann! Martin Bormann!" "Não conheço, tem cara de quê?" "De dirigente de topo do Reich!" Hitler olha novamente para os três rapazes. Estão de camisolas coloridas. "Jovem hitleriano Ronaldo! Onde fica a rua mais próxima?" Ninguém reage. Então, vira-se para o mais novo dos três, que aponta para um canto do terreno.

  No quiosque de jornais da terra, Hitler procura o seu velho diário Völkischer Beobachter. Só vê títulos turcos... "Estranho, os turcos permaneceram fora do conflito, apesar das nossas inúmeras tentativas de o associar à nossa causa." Desmaia ao ler a data, 30 de agosto de 2011, num dos jornais que não conhece. O dono do quiosque julga estar na presença de um ator saído de uma série de televisão. Deixa Hitler ficar uns dias com ele no estabelecimento. "Olhe que o senhor imita-o bem, hã?" Hitler fica indignado. "Pareço algum criminoso?" "Parece o Hitler", diz o vendedor de jornais. "Precisamente!", responde o Führer...

  Transformado em vendedor de jornais, o ditador é "descoberto" por uma empresa de conteúdos para televisão. Os produtores veem nele um "enorme potencial". Ele fica danado... O êxito do programa é impressionante. Desamparado, Hitler acordou numa sociedade onde o sucesso é medido em termos de audiências, em "gostos" no Facebook e coisas do género. Torna-se um ator cómico reconhecido... "O senhor vale ouro, meu caro! Isto é apenas o início, acredite em mim!", felicita-o o produtor.


Numa cultura em que se glorifica o sucesso o que aconteceria se Hitler voltasse?

É esta a pergunta que Vermes coloca e que motiva o livro. E esta pergunta é válida. E se um Hitler aparecesse hoje?

A resposta parece ser óbvia. Tendemos a imaginar Hitler como sendo um monstro. Mas esta imagem é virtual, é, na verdade, uma fuga - uma estratégia de defesa: parece que a culpa foi exclusivamente dele. O Mal é, assim, reduzido a Hitler. Contudo, a verdade é que Hitler não precisou de matar com as suas mãos porque teve milhões a seguirem-no, a admirá-lo, a idolatrá-lo.

Um Hitler não é uma figura monstruosa - pelo menos não a é no sentido vulgar.

Vulgarmente, um monstro é uma criatura feia, que causa repulsa. Hitler não foi nada disso. Quando se fala da possibilidade de surgir um novo Hitler não se deve considerar essa possibilidade como se se tratasse de um monstro, alguém que causa repulsa. A figura de um hitler não tem nada que ver com repulsa, muito pelo contrário. Tem que ver com atracção. Um hitler é uma figura que exerce atracção sobre as pessoas, sobre os seus concidadãos, sobre a esmagadora maioria dos homens e das mulheres que o ouvem e escutam.

Isto não quer dizer que eu admiro Hitler. Pelo contrário. Hitler causa-me repulsa. Da mesma maneira, suponho que a maioria de nós não admira Hitler. Suponho que o Hitler histórico, essa figura que existiu no passado da Europa, nos causa repulsa à maioria de nós. E isso é assim porque esse Hitler se tornou, para nós, um monstro - se quisermos, porque se revelou a sua verdadeira natureza: monstruosa. Hitler foi um monstro.

Contudo, Hitler não foi um monstro para os homens do seu tempo. Foi um político com um talento fantástico. Exercia um fascínio a que poucos foram capazes de resistir. É isto que é um hitler. Uma figura fascinante, capaz de cegar todos à sua volta, capaz de tornar homens em máquinas, humanos em marionetas. É por isso que a pergunta é válida: estaríamos, hoje, em condições de resistir ao talento de um hitler?

A verdade é que vivemos numa sociedade dominada pelo sucesso. Ora, hitler é a figura do bem-sucedido por excelência.

Vermes põe uma hipótese - mas haveria tantas outras. Tantas formas de um hitler se impor.

Em geral, penso que há um perigo em banalizar a figura de Hitler. Há mesmo um grande perigo em rir de Hitler. O Hitler dos comediantes parece-me sempre monstruoso - justamente porque faz rir. Ajuda, de facto, a dar descanso às almas. Parece, de facto, que houve apenas um culpado: Hitler. Um culpado de quem agora nos rimos, como por uma espécie de castigo, ou como sinal de indiferença, ou como forma de passar à frente e perdoar - não Hitler, mas todos os outros.

Ora, uma das mais-valias deste livro é mostrar que o busílis não está em hitler - não o está exclusivamente, nem o está primordialmente. O busílis está, precisamente, na consciência de cada um, na facilidade com que ela pode ser adormecida, com que ela pode ser silenciada. O busílis está, precisamente, na indiferença, no descanso da alma, na desculpa. Porque há coisas que não têm desculpa, que não devem ser deixadas para trás e perante as quais jamais se deve permanecer indiferente sob pena de perdermos aquilo que, no sentido mais nobre, faz de nós humanos.


“Temos em excesso um estereótipo de Hitler, sempre o mesmo: o monstro que nos deixa tranquilos. Eu próprio, durante muito tempo, aceitei essa visão de Hitler. Mas ela não basta. Hitler exercia um verdadeiro fascínio. Se tantas pessoas o ajudaram a cometer crimes, foi porque gostaram dele. As pessoas não elegem um louco. Elegem alguém que as atrai ou por quem sentem admiração. Apresentá-lo como um monstro equivale a fazer dos seus eleitores idiotas. E isso tranquiliza-nos. Pensamos que, hoje, somos mais inteligentes. Nunca elegeríamos um monstro nem um palhaço. Mas, na época, as pessoas eram tão inteligentes como nós! Isso é que custa... Muitas vezes, diz-se que, se um novo Hitler surgisse, seria fácil de contrariar. Tentei mostrar, pelo contrário, que ainda hoje, Hitler teria boas hipóteses de ser bem-sucedido. Só que de outra forma."
 Timur Vermes 







quarta-feira, 11 de setembro de 2013

Deste tempo, deste mundo

A propósito deste mundo


E o senhor elogiou o feitor de injustiça pois fez sensatamente: pois os filhos deste tempo são mais sensatos do que os filhos da luz na sua própria geração.
Lucas 16:8
καὶ ἐπῄνεσεν ὁ κύριος τὸν οἰκονόμον τῆς ἀδικίας ὅτι φρονίμως ἐποίησεν· ὅτι οἱ υἱοὶ τοῦ αἰῶνος τούτου φρονιμώτεροι ὑπὲρ τοὺς υἱοὺς τοῦ φωτὸς εἰς τὴν γενεὰν τὴν ἑαυτῶν εἰσιν.

O "senhor" a que o trecho se refere não é Jesus, nem Deus, mas sim o senhor para o qual trabalha o feitor. O "feitor" - literalmente, "aquele que gere a casa", οἰκόνομος - utiliza as suas artimanhas, em seu proveito, com injustiça. O seu senhor, i.e., o seu patrão elogia-o, mas não elogia a injustiça. O feitor, de facto, enganou o patrão, mas o patrão, não se sabendo enganado, fica contente com a colecta que o feitor apresentou. Contudo, o feitor foi efectivamente esperto porque fez com que os registos coincidissem com a colecta apresentada - na verdade, os registos não foram justos: o feitor fez com que fossem feitos em seu proveito e não em proveito do seu patrão, nem em proveito do que é justo. Mas justamente pela sua esperteza o feitor acabou por ser elogiado pelo patrão enganado.
Aqueles que se preocupam com as coisas do mundo são mais espertos, mais eficazes e mais proficientes do que aqueles que se ocupam da luz - justamente porque não se preocupam com as coisas do mundo parecem descoordenados e insensatos.

Ninguém se engane a si mesmo. Se alguém julga ser sábio entre vós neste tempo, que se torne estúpido, para que venha a ser sábio.
1 Coríntios 3:18
Μηδεὶς ἑαυτὸν ἐξαπατάτω· εἴ τις δοκεῖ σοφὸς εἶναι ἐν ὑμῖν ἐν τῷ αἰῶνι τούτῳ, μωρὸς γενέσθω, ἵνα γένηται σοφός.
Mas a sabedoria do mundo é ignorância, de tal modo que para adquirir a verdadeira sabedoria é preciso ser ignorante nas coisas do mundo. A sabedoria do mundo é apenas uma ilusão em que cada um se ilude a si mesmo.



Respondendo-lhe disse o senhor: «Marta, Marta, ansiosa e afligida por tantas coisas, mas uma [apenas] é precisa. De facto, Maria escolheu a boa parte a qual não lhe será retirada.
Lucas 10:41-42
ἀποκριθεὶς δὲ εἶπεν αὐτῇ ὁ κύριος, Μάρθα Μάρθα, μεριμνᾷς καὶ θορυβάζῃ περὶ πολλά, ἑνὸς δέ ἐστιν χρεία·Μαριὰμ γὰρ τὴν ἀγαθὴν μερίδα ἐξελέξατο ἥτις οὐκ ἀφαιρεθήσεται αὐτῆς.
As pessoas ocupam-se de tantas coisas que acabam na aflicção. A imensidão de coisas que as preocupam apertam-nas, sufocam-nas. Nessas aflições gastam tempo de vida, mas gastam a vida em coisas que são deste mundo e que, portanto, pertencem ao mundo. Não podem ser levadas e uma vez que chegue a morte tudo fica no mundo mas vai-se a vida e vai-se o tempo. Assim, as pessoas gastam a vida com coisas que só servem enquanto há tempo e servem na medida do mundo. E este é o problema, porque então a morte, se só se têm coisas do mundo, reduz tudo a nada e vai-se tão nu como se chegou ao mundo - por mais riqueza, sucesso, fama ou felicidade se tenha acumulado no mundo, sendo coisas do mundo, são sempre do mundo. Na verdade, nada disso chega alguma vez a ser, verdadeiramente nosso. Na verdade, nem mesmo se conquistarmos o mundo inteiro ele nos pertence. Nada do mundo pode ser adquirido pelo humano, justamente porque é do mundo, é exterior, é outra coisa.
Ou já se nasceu com tudo o que é preciso, ou nada do que é verdadeiramente preciso pode alguma vez ser adquirido. Ou se tem adquirido desde início tudo, ou nada vale a pena. Ou tudo ou nada. Só o que desde sempre já estava adquirido não nos pode ser retirado - desde que o escolhamos e o preservemos.

quarta-feira, 4 de setembro de 2013

Se alguém quer seguir-me, negue-se a si mesmo

A propósito de Jesus

Disse Jesus assim: "Εἴ τις θέλει ὀπίσω μου ἔρχεσθαι, ἀρνησάσθω ἑαυτὸν" ("Se alguém quer seguir-me, negue-se a si mesmo") - Lucas 9:23.


Jesus foi uma figura revolucionária porque aquilo que ele disse e fez não se enquadrava no comum, habitual e consensual. Aliás, aquilo que Jesus disse e fez não se enquadra, ainda hoje, tal como naquele tempo, no comum, no hábito, no consenso.

Habitualmente, as pessoas gostam de recorrer às palavras de Jesus, mas fazem-no para confirmar e apoiar aqueles pensamentos e aquelas ideias que julgam ser as melhores opiniões disponíveis. Ao fazerem isto não tomam verdadeira atenção às palavras para perceber o que está a ser dito. O comum dos mortais tem certas ideias feitas e parece-lhe que Jesus deve ter querido dizer aquilo que ele mesmo diria.

Mas Jesus não é um mestre qualquer. Quando pedem que Jesus os deixe seguirem-no, Jesus não se mostra entusiasta, de fácil trato, capaz de tudo para ter uma boa multidão atrás de si. Pelo contrário. A um que pede que Jesus espere enquanto ele vai enterrar o pai, Jesus diz que deixe os mortos enterrarem os mortos. A outro que pede a Jesus que espere enquanto se vai despedir da família, Jesus exige que não olhe para trás. Jesus chega ao ponto de explicar que quem o quiser seguir tem de odiar - sim, ODIAR - a família, odiar a própria alma... quem é este mestre que exige que cada um se negue a si mesmo, negue a sua mãe, a sua mulher, a sua riqueza, os costumes, até a moral, para o seguir???

De facto, o costume de enterrar os mortos é antigo. Mas Jesus não parece importar-se com esse velho costume - que pode ser considerado um preceito moral, um hábito de respeito para com o falecido, para com o familiar desaparecido. É velho o preceito de respeitar pai e mãe - mas Jesus exige que quem vai ter com ele odeie o seu próprio pai e a sua própria mãe (Lucas 14:26)...

Esta forma de falar é mais evidente em Lucas, o qual parece menos preocupado com a reputação de Jesus. Seja como for, é evidente que não devemos aproximar-nos da figura de Jesus convencidos de que estamos na posse de uma clareza de juízo, como se pudéssemos esperar que Jesus se nos dirigi-se com as mesmas ideias que nós já temos. Devemos aproximar-nos de Jesus com a mente aberta... muito aberta.




terça-feira, 3 de setembro de 2013

Férias 2013

A propósito de livros...


É habitual recomendarem-se livros para se lerem durante as férias. Mas por que não recomendar livros depois das férias? Justamente, nas férias, lemos alguns dos livros com mais interesse, sem outro motivo que não o interesse neles. Por isso, depois das férias deste ano, recomendo estes dois pequenos livros, que são dois estudos bastante profundos, muito interessantes e perspicazes:

de António de Castro Caeiro, Por Si  Próprio (Com base em Max Scheler),
de Diogo Morais Barbosa, Natura Semper in se Curva - a vinculação a si e a possibilidade de desvinculação segundo Duns Escoto

ambos da colecção Cadernos - Centro de Estudos de Filosofia, Universidade Nova de Lisboa, coordenada por Maria Luísa Couto Soares e com a chancela da Fundação Eng. António de Almeida
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