sábado, 9 de dezembro de 2017

Há coisas que não me é permitido fazer para me tornar feliz?

A propósito de dever e de felicidade


Ouve-se muitas vezes: "o que interessa é se és feliz com as tuas escolhas."

Nestas circunstâncias pode perguntar-se: ora, é certo que eu quero ser feliz, mas será que por isso me é lícito empregar todos os meios para isso, sejam quais estes forem? Será que, para ser feliz, devo matar? Para ser feliz posso enganar os meus colegas de trabalho para, desse modo, obter uma promoção e singrar na carreira para, assim, ser mais feliz?

Ouvem-se então as mais curiosas declarações do tipo: "um assassino nunca é feliz", ou "quem engana nunca pode ser um bom profissional", ou "quem faz esse tipo de coisas nunca é feliz consigo mesmo".

Podemos, neste caso, chamar a atenção para as estatísticas que mostram que entre os profissionais de topo há tantos psicopatas como nas cadeias, e que os psicopatas tendem a ser os melhores profissionais, embora não tenham qualquer problema em enganar, mentir, etc.

"Ah, mas os psicopatas não são felizes."

E pronto. A coisa pode continuar indefinidamente. As pessoas querem que o mais importante seja a felicidade, mas depois não querem aceitar que seja permitido matar, roubar, etc., para se ser feliz. Então, confrontadas com o dilema, preferem acreditar que quem faz essas coisas não é feliz, esquecendo o essencial da questão: é que quem mata, provavelmente, fá-lo porque acredita que isso contribuirá para a sua felicidade - ou não será que o fez porque procurava ser infeliz? Ora, se fez o que fez em vista à felicidade, então o problema é, precisamente, o de saber se, em vista à felicidade, tudo é permitido, incluindo roubar e matar.
Como se percebe, é absolutamente irrelevante se o sujeito se torna efectivamente feliz ou não. O ponto é apenas saber se me é lícito fazer seja o que for que me pareça ser útil à minha felicidade.

terça-feira, 5 de dezembro de 2017

A questão dos meios de prova e acreditação

A propósito do movimento flat Earth


Descontando a parvoíce do movimento «flat Earth», ou «Terra Plana», acho-lhe piada.

Acho-lhe piada porque em 2014 eu escrevia qualquer coisa assim «A (pretensão de) evidência resulta já de um regime de sentido prévio, como se pode confirmar se se tentar convencer alguém de que a Terra é redonda. Quem duvidar realmente disso, dificilmente irá acreditar nos mapas ou nas imagens. Mesmo que se faça uma viagem de circunvalação, não se tem como apresentar o trajecto de uma vez. As evidências só podem ser mobilizadas no contexto de um regime de sentido.»

A ideia é que «provar» que a Terra é redonda a alguém que, efectivamente, duvide disso é extraordinariamente difícil. É difícil porque, se o sujeito em causa duvida que a Terra é redonda, isso significa (se tal dúvida não resulta apenas de uma questão de ignorância) que o sujeito não valoriza os meios de prova que suportam, precisamente, a tese de que a Terra é redonda. Quer dizer, se o sujeito duvida que a Terra é redonda, então, provavelmente, isso significa que não aceita como meio de prova o testemunho dos manuais, das enciclopédias, da televisão, dos jornais, da fotografias, dos relatos de observações dos astronautas, etc. 
Por vezes pensa-se que bastaria pegar no sujeito e pagar-lhe uma volta ao mundo, mas isso é um equívoco. Não seria possível apresentar a «volta ao mundo». Na verdade, se eu vou num avião que dá a volta ao mundo, ou eu acredito que é isso que está a acontecer, ou não há forma empírica de comprovar que é isso que está a acontecer.
O ponto é, precisamente, esse: a prova só é possível num contexto de credibilidade de determinados meios aceites como constituindo «prova». Eu acredito que a Terra é redonda porque aceito determinados meios como suficientes para validarem essa minha crença. Mas não tenho qualquer forma de verificar, por mim mesmo, que a Terra é redonda. A não ser, é claro, que eu próprio possa ir ao espaço confirmá-lo, o que não é viável para toda a gente.
Na verdade, eu não posso aplicar arbitrariamente o princípio da rejeição do argumento de autoridade. Se eu aceito argumentos de autoridade em alguns casos e não noutros, coloca-se a questão de saber quais são os critérios que validam essa aplicação selectiva. Por sua vez, a escolha desses critérios, o facto de eu usar estes e não aqueles, já denuncia um sistema de validação. Quer dizer, se eu aceito o que dizem os professores, os especialistas, os cientistas sobre coisas que eu não poderia confirmar por mim mesmo, mas não aceito o que dizem os xamãs, os feiticeiro e os padres, isso já revela, desde início, um sistema de validação que, evidentemente, tenderá a conformar-se com a visão dita científica do mundo.

Até certo ponto, de um modo ou de outro, a visão que se tem do mundo, o regime de sentido que se habita, o sistema de acreditação que cada um de nós tem em uso, incorpora sempre um elemento de arbitrariedade.

sexta-feira, 1 de dezembro de 2017

A 01-12-2017


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