quarta-feira, 1 de novembro de 2017

A aporia socrática

A propósito de aporia


«apressar-se para conhecer outras coisas sem se conhecer a si mesmo é risível»
Olimpiodoro

Olimpiodoro sugere que o início da filosofia esteja no conhecer-se a si mesmo, ou melhor, no reconhecimento da aporia em relação a si mesmo. A aporia seria, assim, um estágio. O reconhecimento da própria ignorância trata-se, assim, de um meio que visa um fim, não é um fim em si mesmo. O reconhecimento da ignorância é, para os platónicos, e a começar pelo próprio Platão, uma porta de entrada para o conhecimento, porque é o começo da perseguição, a instalação do sujeito numa situação de "amor" - no sentido particular que o amor sempre tinha para os gregos.

Mas se virmos bem, de Platão em diante, há já sempre algo que não encontramos em Sócrates. Sócrates aponta, precisamente, para a aporia como estabelecimento de algo de novo em relação ao que há antes disso. A ignorância. Convém lembrar que "aporia", em grego, poderia significar caminho de difícil transposição, mas também sem saída. O que está em causa é, precisamente, algo de difícil acesso, mas também algo de onde só muito a custo se poderá sair, e de onde pode não se ter ângulo de visão para qualquer saída.

É discutível que Sócrates considerasse a aporia um estágio, algo como um mero ponto de passagem. Porque é discutível que Sócrates aceitasse que a verdade pode ser aprendida e, por isso, é discutível que aceitasse que pudesse haver, de facto, "conhecimento". Pelo menos, conhecimento no sentido grego do termo: algo que efectivamente se sabe.

Certo é que Sócrates achava que só quem se desse conta da sua própria ignorância poderia, de facto, começar a procurar conhecer - mas daí não se segue que a aporia seja um mero local de passagem: pois, para que o seja, é preciso admitir que é possível conhecer. Não é certo que Sócrates aceitasse que alguma vez se pudesse conhecer alguma coisa.

Pode acontecer que o estado mais próximo do conhecimento em que nos possamos encontrar seja, precisamente, o estado em que estamos em perseguição. E parece ser para qualquer coisa desse tipo que Sócrates aponta - embora, evidentemente, também isso não seja dito por ele, nem o poderia ser, porque para poder afirmar isso teria de presumir saber.

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