A propósito de cisão interna...
Os relatos dos psicanalistas acerca dos seus "paciente" são reveladores. Um sujeito vai ao psicanalista e confessa que trata a mulher como se fosse um cão e o resto das pessoas como se fossem objectos - e sabe que o faz, e sabe que isso está mal, porque foi por isso que resolveu ir ao psicanalista.
O psicanalista percebe que há uma cisão interna ao sujeito. À primeira vista parece que não há uma cisão porque o sujeito comporta-se de uma maneira e sabe que se comporta dessa maneira (o que é diferente daquele sujeito que trata mal a mulher mas não o reconhece).
Mas há uma cisão. Aquilo que o sujeito faz e aquilo que o sujeito pensa que deve fazer estão em contradição. No caso do sujeito que não o reconhece, como não o reconhece, não percebe que há uma contradição, mas a contradição está lá. Mas no caso do sujeito que o reconhece, então torna-se evidente para o próprio sujeito que há uma contradição, que está a ser X mas que quer ser Y - e como não o oculta para si mesmo, a contradição torna-se evidente na consciência. Mas, então, surge uma nova contradição: o sujeito sabe que deve alterar o modo como trata a mulher, mas não o faz. Há sujeitos que reconhecem isto, mas depois pensam que não há mal nenhum nisso. Pensam que, como sabem que estão a fazer mal, de algum modo já estão a ter consciência. Há imensos relatos de pessoas que disseram isto nos julgamentos de Nuremberga... A pessoa faz um mal que reconhece como mal, e como reconhece isso como mal assume que ela é diferente dos "verdadeiros nazis", que ela própria é, afinal, alguém que está a fazer o mal porque não tem outra hipótese.
Mas o sujeito que vai ao psicanalista e reconhece que a forma como trata a mulher está errada, e reconhece que o decisivo é deixar de tratar a mulher dessa forma (e não apenas reconhecer que a trata mal) - este sujeito tem uma cisão interna muito mais profunda, de certa forma ele é muito mais culpado do que todos os outros que não reconhecem que estão a fazer o mal, mas por outro lado este sujeito, que é o mais culpado de todos, é também o que está mais próximo de se "curar": porque admitiu que há uma cisão e que quer resolver esse conflito de si consigo e já percebeu que o seu verdadeiro obstáculo é ele mesmo.
O que eu não percebo é por que, depois de análises tão profundas, os psicanalistas caiem no ridículo e atribuem estas cisões internas a coisas como uma orientação precoce para os peitos, ou coisas parvas deste género!!!
terça-feira, 18 de fevereiro de 2014
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