sexta-feira, 18 de janeiro de 2013
O imediato: a elisão das possibilidades alternativas
Não se duvida de uma crença imediata. Aquilo de que não se pode duvidar é uma crença imediata. A crença imediata é indubitável porque é o horizonte da própria dúvida: não pode ser visto apesar - ou, precisamente, devido à sua imediaticidade.
Somos imediatamente quando nos deixamos levar por aquilo que nos prende. Num certo sentido, o imediato é aquilo que não temos de nos esforçar por ser, ainda que nos tenhamos de esforçar para isso.
Aquilo que nos impede de ser imediatamente é sentido como infortúnio. A dor é um grande infortúnio. Choramos a dor que nos tolhe. Queremos ver-nos livres dela. Sabemos bem o que é a dor, e sabemos bem o que é o prazer. O prazer e a dor prendem-nos num caminho imediato. O caminho do prazer: a dor é o resguardo.
Imediatamente somos como uma planta. O nosso desenvolvimento é o crescimento vegetativo e só a muito custo nos podemos compreender como vegetais. Ser como um vegetal é precisamente o modo que inicialmente compreendemos como ser aquilo que somos. Quando a vida nos corre bem, quando tudo se dispõe a permitir-nos ser aquilo que imediatamente somos: é então que nos julgamos felizes, nos julgamos afortunados. E é então que nos julgamos livres.
Para nós, imediatamente, a liberdade é que o sol e a chuva e a terra e os poderes ignorados da nossa natureza nos permitam ser como uma planta.
É um pensamento muito profundo que estejamos presos numa cadeia infinita. O que é que isso pode querer dizer? Que verdade misteriosa viu Fernando Pessoa nisto?
Atiramos ao ar os nossos vãos desejos de liberdades que não temos, mas não executamos aquela que temos. E se nos apontam a porta de saída nós não queremos outra coisa senão permanecer onde estamos.
Crescemos, de facto, como uma planta: e pensamos que isso é o máximo que temos para ser.
A possibilidade em que nos encontramos desde início: é essa que nós desenvolvemos. E tornamo-nos cada vez mais desconhecidos para nós mesmos. Cada vez somos possuídos em maior grau pelo que supomos adquirir, de tal modo que a dada altura se torna absolutamente impossível reconhecer quem somos. Porque, de facto, somos essas coisas. Somos uma coisa.
É, aliás, isso que compreendemos todos os dias quando dizemos que devemos tornar-nos úteis. O pensamento mais elevado que conseguimos ter acerca de nós mesmos é vermo-nos como um martelo se veria. Mas o martelo sabe melhor que isso: antes não ver do que ver-se como martelo. Ou tudo, ou nada.
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