Como se sabe, Nietzsche passou o tempo a escrever contra uma criatura a que chamava o cristão. Acontece, porém, que é preciso atentar a que categoria Nietzsche se está a referir. O que pretende ele dizer quando fala de o cristão?
Quando Nietzsche se refere ao cristão, normalmente, refere-se a um determinado tipo de humano que não põe em acto aquilo que diz ser.
Ou seja, para Nietzsche, o oposto de ser cristão significa exercer uma prática continuada de um determinado juízo de valor.
Assim, o que Nietzsche está a dizer é que aqueles sujeitos que normalmente se dizem cristãos não são autenticamente cristãos. Não são autenticamente coisa nenhuma: são uma ilusão para si mesmos pois, na medida em que se julgam já cristãos, não só não fazem por vir a ser cristãos, como não fazem por vir a ser autenticamente o que quer que seja. Só é autêntico aquele em que o juízo de valor se torne acto. E o cristão é aquele que fala, discursa, dá sermões ou reza missas, mas não é cristão.
O cristão de Nietzsche é aquele que não é quem pensa ser; pensa ser algo que não é; julga-se a si mesmo em conformidade a um ideal do qual não tem nada.
Neste sentido, Nietzsche não difere de Kierkegaard: assim como Kierkegaard distingue entre a Cristandade e o Cristianismo, Nietzsche distingue entre o cristão e o cristão autêntico.
a palavra «cristianismo» já é um equívoco: no fundo, houve apenas um cristão, e esse morreu na cruz. [...] É falso até ao absurdo ver numa dada «crença», porventura a crença na redenção por Cristo, o distintivo do cristão: somente a prática cristã, uma vida tal como a viveu aquele que morreu na cruz, é que é cristianismo... Ainda hoje, uma vida semelhante é possível, para certas pessoas até é necessária: o cristianismo autêntico, originário, será possível em todas as épocas. Não um crer, mas um fazer, ...
Nietzsche, O Anticristo, §39
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