1. Podemos afirmar que Sócrates era humilde?
Não sei se ele era humilde. Talvez a ideia (aspecto) de um Sócrates humilde, "memorável", justo e recto, amigo dos seus amigos e bonacheirão se adeqúe ao retrato desenhado por Xenofonte. Mas não ao de Platão... na primeira fase...
2. Sócrates procura a verdade por intermédio da comparação entre "opinião" e "realidade"?
A procura da verdade através da comparação com a realidade. O problema com a "realidade" é que só se podem comparar opiniões / construções mentais com ela se, e apenas se, for o caso dela já estar dada à partida. Mas se ela já está aí, então que é que eu estou a perguntar? Se eu penso X, vou comparar X com a realidade R, para saber se X é real (R)? Ora, se o que se quer saber é o que é R, então só se coloca verdadeiramente a questão de saber o que é X (o que eu penso), se admito que não sei o que seja R (com o qual se pretende comparar X)... Ou seja, admitir que há sem mais R aí dado, ou adquirido, para com o qual uma contrastação se faz possível, é tomar aquelas coisas que Sócrates investiga, como se elas se tratassem de entes ao modo de sandálias, mas "cuidar de calçado não é o mesmo que cuidar de pés" (vide Alcibíades I, p.ex. 128a e seg., embora dada a dúvida sobre autenticidade).
3. Mas, então, a que é que corresponde o ἐλέγχειν?
O famoso "elencar" de Sócrates mostra à saciedade que, quando se supunha adquirido aquilo de que se falava (R), afinal nada lá havia de correctamente (ὀρθῶν) adquirido. Daí a aparente contradição entre as obras Críton (que pensa haver razões para um tratamento privilegiado de Sócrates face à "injustiça" de que é alvo) e Êutifron (que pensa que nem os próprios familiares devem ficar imunes à justiça). Afinal, nem um nem outro sabem daquilo que falam, e a comparação daquilo que dizem com aquilo que dizem estar a dizer, mostrará que dizem X, supondo R, quando é R que, afinal, continua por apurar.
4. O que é que sabe, afinal, Sócrates?
Vide Platão, Apologia de Sócrates, 21d: κινδυνεύει μὲν γὰρ ἡμῶν οὐδέτερος οὐδὲν καλὸν κἀγαθὸν εἰδέναι, ἀλλ᾽ οὗτος μὲν οἴεταί τι εἰδέναι οὐκ εἰδώς, ἐγὼ δέ, ὥσπερ οὖν οὐκ οἶδα, οὐδὲ οἴομαι: ἔοικα γοῦν τούτου γε σμικρῷ τινι αὐτῷ τούτῳ σοφώτερος εἶναι, ὅτι ἃ μὴ οἶδα οὐδὲ οἴομαι εἰδέναι."corremos certamente o risco de nenhum de nós saber alguma coisa do que é belo e bom, mas enquanto ele supõe que sabe não sabendo, eu, como de facto nada sei, nada suponho [saber]. E pelo menos neste pouco realmente pareço mais exímio que ele, por não supor saber disso que também não sei".
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