quarta-feira, 18 de novembro de 2015

Ética e direitos

A propósito de Peter Singer

Quanto a Singer, a sua argumentação está sempre dependente de um conjunto básico de premissas. A sua resposta está determinada pela premissa que toma a senciência como critério para a identificação do sujeito de direitos. Portanto, com certeza que ele admite a legitimidade de se matarem crianças que não possuam tal critério - assim como não a admite em animais que possuam esse critério. 

O que me parece errado é considerar que a noção de certo ou errado, de bem ou mal, de moralmente aceitável ou não, esteja dependente do critério da senciência. Da mesma maneira - tenho muita pena, mas - considero que o seu conceito de interesse tem muito pouco de filosófico. Ou melhor: dizer que um porco tem interesses parece-me ser uma antropomorfização do porco - e não que é a consideração de que só o humano tem interesses que é um "especismo" indevido

Finalmente: do ponto de vista ético parece-me que só há deveres, isto é, o ético tem sempre a forma de uma injunção: quando vejo uma criança com fome sinto uma compulsão ética no sentido de a alimentar (ou não, no caso dos psicopatas, mas então também não adianta fazer-lhes um discurso racional porque o psicopata não se converterá à ideia de que os interesses dos outros valem tanto como o dele). 
A noção de direito tem que ver com um estabelecimento de um poder que garanta a sua protecção. Qualquer ideia de que há "direitos naturais", ou direitos previamente existentes em si mesmos, etc., é uma espécie de misticismo. Quando vejo um cão a ser agredido por miúdos com paus sou compelido (dever) a intervir e a evitar tal sofrimento. Quando vejo um touro a ser lidado na arena sou compelido a manifestar-me contra tal. Nada disso significa que o cão ou o touro tem direitos. Mas uma comunidade que converge relativamente a certos sentimentos morais, em que os indivíduos se sentem tomados por certos compromissos éticos, e que está organizada politicamente, pode então produzir normas legais que criem, definam e protejam certos direitos aos homens e aos animais não-humanos.

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