Stricto sensu, não há «crimes legalizados». De facto, Eichmann obedecia a ordens superiores, mas também obedecia a leis. Assim, no seu julgamento, o próprio Eichmann refere-se ao Nazismo como «período de crime legalizado pelo Estado».
A expressão é curiosa e interessante, porque refere-se à situação em que certos comportamentos estão «legalizados», mas de algum modo são reconhecidos como «crimes». Daí, «crime legalizado».
Mas a expressão é uma contradictio in terminis. Um crime é um acto ilegal, um acto que viola uma lei. Por isso, um acto legalizado, permitido pela lei, não pode ser um crime.
Acontece, porém, que quando se reconduz a ética ao direito e se pensa que «se é legal, posso», ou ainda pior: que, «se é legal, devo», fica-se sem modo de designar aquelas acções que são reconhecidas como indevidas mas que são legalizadas por um ordenamento jurídico. Daí, Eichmann referia-se ao «crime legalizado pelo Estado», porque lhe faltava a noção ética correspondente ao termo jurídico («crime»). Tinha o conceito de transgressão legal, mas não o de transgressão ética - e aqui procurava, precisamente, essa noção de uma «transgressão» perpetrada por um «acto legalizado pelo Estado».
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