sexta-feira, 23 de maio de 2014

A atracção da consciência pela inconsciência

A propósito de sonambulismo.



Regra geral e ordinariamente, a consciência de um indivíduo ocupa-se sobretudo de garantir a diminuição do esforço. Qualquer economista, biólogo, agente de marketing, sabe isto e aplica-o diariamente. Aquilo que os homens mais desejam é "obter com facilidade, rapidamente, e sem esforço". E querem tanto isto que, na maioria das vezes, não só querem obter sem esforço aquilo que querem, como também se convencem a si mesmos que querem apenas aquilo que não lhes exige esforço.

Isto tudo quer dizer que há um receio íntimo na consciência acerca de si mesma - há uma espécie de medo inconsciente de intensificar a consciência, e este medo parece fazer parte da própria consciência como ela habitualmente se mantém. Quer dizer: a consciência é naturalmente atraída pela inconsciência - o estado de vigília é naturalmente atraído pelo adormecimento. (Não se deve confundir isto com a preguiça - que é, de facto, um modo, mas apenas um, desta atracção pelo adormecimento).

Dito de outro modo, os homens desejam naturalmente ser sonâmbulos - o que revela que eles não o são. Isto pode ser dito assim: a natureza tende para o menor caminho que leva à fonte, e a consciência, no início e na maioria das vezes, rege-se por esta regra natural.

No entanto, e de modo decisivo, a intensificação da consciência dá-se só e apenas na intensificação do esforço, e a capacidade humana para resistir à tentação é, justamente, a marca de que é um si mesmo, e isto quer apenas dizer que um homem não é um si mesmo senão por via do esforço... Então, a questão é: mas se a consciência se vive habitando um estado de sonambulismo voluntário, se o sujeito está a dormir enquanto está acordado, como é que ele se pode acordar a si mesmo?

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