A propósito de, Deus...
Um terceiro deus
By José Saramago
"Creio que as teses de Huntington sobre o “choque de civilizações”, atacadas por uns e celebradas por outros aquando do seu aparecimento, mereceriam agora um estudo mais atento e menos apaixonado. Temo-nos habituado à ideia de que a cultura é uma espécie de panaceia universal e de que os intercâmbios culturais são o melhor caminho para a solução dos conflitos. Sou menos optimista. Creio que só uma manifesta e activa vontade de paz poderia abrir a porta a esse fluxo cultural multidireccional, sem ânimo de domínio de qualquer das suas partes. Essa vontade talvez exista por aí, mas não os meios para a concretizar. Cristianismo e islamismo continuam a comportar-se como inconciliáveis irmãos inimigos incapazes de chegar ao desejado pacto de não agressão que talvez trouxesse alguma paz ao mundo. Ora, já que inventámos Deus e Alá, com os desastrosos resultados conhecidos, a solução talvez estivesse em criar um terceiro deus com poderes suficientes para obrigar os impertinentes desavindos a depor as armas e deixar a humanidade em paz. E que depois esse terceiro deus nos fizesse o favor de retirar-se do cenário onde se vem desenrolando a tragédia de um inventor, o homem, escravizado pela sua própria criação, deus. O mais provável, porém, é que isto não tenha remédio e que as civilizações continuem a chocar-se umas com as outras."
Texto de José Saramago in O Caderno de Saramago
segunda-feira, 7 de setembro de 2009
Subscrever:
Enviar feedback (Atom)
Os textos publicados neste blog por luisffmendes estão sob uma licença Creative Commons
Um terceiro deus pode ser entendido, também, como uma postura de desconstrução do intersubjetivo.
ResponderEliminarCreio isto porque a questão do ressentimento, que é um valor imaturo e mórbido, tende a eregir o sentimento de vingança do divino, figurado na postura nobre do individuo.