«O estóico afirmava que a virtude é todo o soberano bem, e a felicidade constitui apenas a consciência da posse da mesma virtude enquanto inerente ao estado do sujeito. O epicurista alegava que a felicidade é todo o soberano bem, e a virtude é somente a forma da máxima a ela conducente, consistindo no uso racional dos meios para a conseguir»
Kant, Crítica da Razão Prática
Bem, e ainda estamos nisto. Ainda se encontram hoje estas duas perspectivas.
Uns acham que o bem mais alto a alcançar é a felicidade e que, por isso, a virtude é o modo de vida que nos leva à felicidade, ou que nos traz felicidade. Estes são epicuristas, mas acham que têm uma perspectiva muito "moderna" e "revolucionária". Quase se engasgam quando descobrem que esta é uma perspectiva tão antiga como o cagar na história da Filosofia.
Outros acham que o bem mais alto a alcançar é cumprir o dever, é ser-se virtuoso, é fazer-se o bem, e que ter a consciência de que se fez o bem, de que se cumpriu um dever, de que se é virtuoso é a própria felicidade. Quantas vezes ouvimos isto: "ser feliz é ajudar os outros", ou "ajudar os outros torna-nos felizes". E pronto, também estes acham que têm uma perspectiva "revolucionária" e muito "moderna". Mas é mais uma perspectiva tão velha como a fome.
Eu concordo com Kant: tão parvo é achar que "ajudar os outros" nos faz felizes, como é estúpido achar que o Bem é ser feliz. Nem cumprir o dever, fazer o bem ou ser virtuoso é equivalente a sermos felizes; nem sermos felizes é equivalente a fazer o bem, cumprir o dever ou ser virtuoso.