Jesus não está a pedir-nos que odiemos tudo e todos e a nós mesmos. Mas o que também é errado é presumirmos que a palavra de Jesus deve ser, ou deve adequar-se, àquilo que à partida queremos que nos seja dito. Jesus - como, aliás, outros na história da humanidade - teve essa característica que é a de não encaixar as bitolas habituais. E é sempre uma absurdidade pretender-se fazê-lo caber nos nossos padrões habituais, nos nossos preconceitos, nos nossos juízos ao sabor do senso-comum. Se alguém pretende procurar os ensinamentos de Jesus não deve fazê-lo impondo-lhe a condição de que Jesus só possa dizer aquilo com que à partida concordará. Jesus não lhe dirá sempre o que espera ouvir, não lhe dirá sempre o que quer ouvir. Aliás - se for honesto e não deturpar as suas palavras - verificará que, na maior parte das vezes, Jesus lhe dirá o que não espera ouvir, lhe dirá o que não quer ouvir. Porque já a Abraão não foi pedido que amasse o seu filho acima de todas as coisas, e Jesus também não nos pede que sejamos amigos dos nossos amigos. A Abraão foi pedido que matasse o seu filho, e Jesus pediu-nos que amassemos os nossos inimigos.
Quando Sócrates disse que "vale mais sofrer uma injustiça do que cometê-la", todos o julgaram louco. Quando Jesus disse que "devemos amar aos nossos inimigos", julgaram-no louco. Porque os homens sempre se querem colocar na posição de medida de todas as coisas, mas na maioria das vezes nem sequer sabem qual é a sua própria medida.